quinta-feira, 8 de março de 2012

Aprender o improvável / Learn the improbable / Aprenda el improbable

Há dez mil anos a humanidade inventou a civilização. As comunidades deixaram de ser extrativistas e nômades e desenvolveram relações de produção. Criou-se o trabalho servil e, com ele, a desigualdade e as formas de realização do poder de um sobre o outro. O conhecimento precisava ser decorado e reproduzido a partir dos modelos fornecidos pelas autoridades. O ócio e a vida sedentária também foram inventados.
Há dois mil e setecentos anos a humanidade foi tomada por um modo de pensar que apontava para a possibilidade de conhecer por si mesmo. O anseio pela verdade deixa de ser um desejo para se tornar um método. O que se busca é o evidente, o racional, o lógico, o que pode ser compreendido dentro das categorias de pensamento. O verdadeiro passa a ser aquilo que pode ser percebido e racionalizado.
Há quatrocentos anos a humanidade descobriu a ciência, a possibilidade da certeza e a necessidade da especialização. Uma ruptura se instala e transforma a ciência no campo das incertezas enquanto a religião se mantém como o campo das certezas. Para superar a incerteza, a ciência cria a tecnologia para exercer controle. E para garantir as certezas, a religião se inclina para o dogmatismo, sectarismo, fanatismo e fundamentalismo. Como mediador dessa ruptura surge o mercado para quem todas as coisas se direcionam. Tudo se transforma num produto.
Da segunda metade do século passado para cá a humanidade tem descoberto novas possibilidades de conhecimento, de tal modo que a quantidade de informações fornecidas pelas formas com que o saber se dá é maior que a capacidade de processar. Descobre-se que estamos de fato diante de situações que não se enquadram em nossas categorias de pensamento, de maneira que não dá mais para tratar nossas relações da mesma forma como se fazia no último milênio.
Nessa trajetória toda, duas coisas ficam evidentes: estamos diante de um processo de aceleração do tempo e estamos diante de mudanças que envolvem a nossa condição humana. O ser humano passou de centro das atenções do universo – a criatura mais importante com capacidade de gerenciar a natureza criada, em que tudo gira em torno de si – e se tornou uma ameaça para o equilíbrio de todo o cosmo. Isso nos remete à necessidade de aprender que temos mais situações que nos remetem à dúvida do que às certezas e que isso é essencial para a vida. Eric Hobsbawm denuncia que estamos diante do improvável e que já na há como lidar com o mundo da mesma forma como aprendemos.
Por trás dessa história está a tentativa de se exercer o controle sobre a vida. É o desenvolvimento de uma civilização do controle crescente que deságua nessa sociedade contemporânea do conhecimento e da informação. A capacidade hoje de produzir informações acelera as mudanças e estabelece o improvável. Isso produz deslocamentos nas formas de organização social de maneira que não há como combater seus efeitos sobre o desemprego, as desigualdades e os fracassos das políticas econômicas e públicas. Tudo se torna obsoleto com uma velocidade nunca vista, o que desencadeia a busca de novas formas de controle. Tudo passou a ser transitório e a comportar a diversidade. A incerteza faz parte da nossa vida e somos convocados a buscar novos rumos.
É preciso se dar conta de que a inteligência não está na capacidade de acumular certezas, mas na capacidade de se perceber o processo em que o saber é construído. O sábio não é o que sabe muito, mas o que é capaz de tomar decisões e fazer escolhas diante do improvável. Não se trata mais de buscar resposta, mas de mudar a forma de fazermos perguntas. Não se trata também de evitar as certezas. É preciso se dar conta de que defender certezas resulta em totalitarismo, intolerância e preconceito. O improvável é o espaço do contraditório e condição de liberdade, envolve a aventura de correr riscos para se descobrir e reinventar novos caminhos.

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